Matéria publicada no Jornal da Tarde dia 26/03/2007
Com uma manobra jurídica inesperada, a Prefeitura contornou a situação mais difícil causada pela Lei Cidade Limpa: a necessidade de o estabelecimento comercial possuir o alvará de funcionamento para regularizar sua placa indicativa. Essa exigência seria normal não fosse o altíssimo índice de irregularidades encontrado em São Paulo. De acordo com a Associação Comercial, 85% das 180 mil lojas da Cidade não tem licença para funcionar.
Para resolver a situação sem chegar a atitudes extremas - fechar mais de 150 mil estabelecimentos ou não cumprir a lei - foi publicado um decreto intersecretarial, envolvendo as Secretarias de Habitação e das Subprefeituras, que autoriza lojas sem licença de funcionamento a tirar o Cadastro de Anúncios (Cadan), desde que seja regularizado o Alvará no prazo de 2 (dois) anos.
Se não fosse a resolução, no dia 1º de abril muitos lojistas estariam fora da lei, ainda que tivessem adaptado sua placa às dimensões permitidas. O Cadan provisório vale por dois anos, tempo em que o proprietário deve tirar o alvará para regular sua situação.
Para o vereador Antonio Donato (PT), esse aspecto prático foi esquecido durante a elaboração da lei. “É um problema que foi pensado só agora”, afirma.
Ele diz ainda que o tempo para adaptação dos lojistas previsto na lei é muito curto. “Essa ação atabalhoada não é boa para a Cidade.” Felippe Naufel, do Conselho de Ruas Comerciais de São Paulo, concorda. “A situação vem errada há muitos anos. Não é de uma hora para outra que vamos conseguir regularizar tudo.”
Causas
Os motivos para a falta de alvará alegados pelos comerciantes são diversos. Um deles é a alta exigência da legislação em vigor. Há casos em que os imóveis não comportam as reformas necessárias para a liberação do alvará.
“Pela lei, preciso construir um banheiro a mais. Só que o prédio é antigo, não há como construir mais nada”, reclama Sueli Francisco, dona de uma loja de armarinhos na Pompéia.
A comerciante está revoltada com a lei. “O comércio está uma porcaria, ninguém tem dinheiro. Ainda tenho que trocar a placa. Vou acabar fechando, porque é mais ser camelô e fugir do rapa”, diz Sueli.
Outro aspecto que embaralhou a noção do que está dentro ou fora da lei foram as consecutivas anistias concedidas pelo município a lojas fora das regras.
“As anistias aconteceram sob as gestões do (Paulo) Maluf e da Marta (Suplicy)”, diz Donato. “Alguns dos processos da primeira anistia ainda nem foram avaliados”, explica. Assim, mesmo que não tenha alvará, o estabelecimento pode funcionar.
De acordo com Andrea Matarazzo, secretário de coordenação das Subprefeituras, as regiões da Cidade devem ser pensadas de maneiras distintas no momento da cobrança de documentos dos estabelecimentos.
“Nos lugares mais antigos e ricos, como os Jardins, não existe justificativa para irregularidades. Mas na Zona Sul, por exemplo, onde ainda há problemas fundiários, a conversa é outra”, diz.
Ele explica que o decreto foi elaborado por conta da reclamação de lojistas. “Nos últimos 30 dias recebemos uma série de reclamações sobre alvarás”, conta.
Mesmo com um número grande de lojas sem licença, não haverá um esforço concentrado para regularização. “A fiscalização é feita todos os dias. Vamos continuar come essas ações”, afirma Matarazzo.
LEI COMEÇA NO DOMINGO, SEM MULTAS
Matéria publicada no Estado de São Paulo dia 28/03/2007
No lugar das multas, conversa. A partir de 01 de abril, quando entra em vigor a Lei Cidade Limpa para os comerciantes, a Secretaria de Subprefeituras irá colocar nas ruas seus 700 fiscais para checar se lojas, lanchonetes, padarias, bancos e outros estabelecimentos da cidade estão adaptando suas fachadas às novas exigências. Essa fiscalização, no entanto, será apenas educativa - pelo menos 200 mil folhetos explicativos serão entregues aos comerciantes. Autuações de fato, para alívio de muita gente, só deverão ocorrer a partir de outubro.
"A idéia é não multar por um período de seis meses" , diz Regina Monteiro, diretora de Meio Ambiente e Paisagem Urbana da Empresa Municipal de Urbanização. "Teremos bom senso. Antes de autuar, faremos umcadastro dos 180 mil estabelecimentos da capital e veremos as necessidades caso por caso." O prefeito Gilberto Kassab (PFL) prefere não falar em datas, mas assume que haverá um período de adaptação. "O objetivo da Prefeitura não é sair por aí dando multa para aumentar a arrecadação", diz. "Seria irresponsável. Nossa atuação primeiramente será pedagógica, mostrando como a lei funciona."
O prazo que vence no dia 31 é referente aos chamados anúncios indicativos, que são os letreiros dos estabelecimentos de comércio e de serviços da capital (para os outdoors o prazo se encerrou no fim do ano passado, mas várias empresas do setor ainda mantêm suas placas por força de liminares). De acordo com a lei, imóveis com medida de frente de 10 metros a 100 metros poderão ter letreiros de no máximo 4 metros quadrados, enquanto os totens não poderão ter mais de 5 metros de altura. A multa para os infratores é de R$10 mil por anúncio.
Desde janeiro, muitas empresas deram uma repaginada no visual para se adequar a essas determinações - 46 estabelecimentos pediram ajuda à Companhia de Engenharia de Tráfego nas últimas semanas para retirar seus letreiros gigantes. Segundo a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), as agências localizadas nas grandes avenidas mudaram as fachadas e as outras deverão seguir o exemplo até a semana que vem. O McDonald’s está retirando aos poucos aqueles totens de quase 10 metros de altura com a letra "M". Shoppings como o Ibirapuera, D&D, Center Norte e Butantã retiraram 90% dos letreiros que estavam fora-da-lei, enquanto supermercados procuraram a prefeitura em fevereiro para discutir um plano de ação (cada loja do Pão de Açúcar, por exemplo, deve gastar cerca de R$ 350 mil com as alterações).
Outras empresas, no entanto, intensificaram a batalha judicial contra a prefeitura - em fevereiro, havia 55 processos contra a legislação; atualmente, há cerca de 150. A única liminar concedida até agora foi favorável aos postos de gasolina associados ao Sindicato Nacional das Empresas de Combustíveis, que poderão manter inalteradas suas fachadas. “A Prefeitura precisa dar um prazo maior para as empresas se adequarem, diz Marcel Solimeo, economista da Associação Comercial de São Paulo. “Quase 1 bilhão seriam gastos com as alterações de fachadas em 100 mil estabelecimentos da cidade.”